Você é o Golias do repente, mas eu sou um Davi para lhe vencer

O mote que anima essas estrofes, vê-se de entrada, nos remete ao estilo Peleja ou Desafio, no qual pontifica a arte do insulto ou da provocação recíproca, a desafiar os brios dos contendores.
Embora se trate de uma opção muito freqüente nas cantorias, e com ela as duplas já se sintam familiarizadas, vez por outra, provoca um certo constrangimento ter que duelar com o companheiro. Tanto mais pelo fato de que os contendores não têm muita saída: de um lado, não podem fazer “corpo mole”, já que estariam sob a pressão do público; por outro, não se sentem tão motivados em “massacrar” o companheiro, até porque tal risco vale para ambos da dupla.
Eis por que alguns tratam de encontrar um meio termo, partindo até de estratégias previamente montadas, ainda que apenas parcialmente, já que, em se tratando de improviso, o cuidado é redobrado, para não parecer cair no ridicularizado e combatido “balaio”, expressão pejorativa por alguns utilizada para designar estrofes pré-fabricadas, ainda que dando a entender resultar de algo improvisado.
Em todo caso, a ordem é recorrer à imaginação e à força das expressões.
(…)
Sou valente igualmente a Lampião
Eu já tenho o rifle e a peixeira
O cangaço é também minha trincheira
Um punhal pra botar em cada mão
Tenho algema que prende o campeão
Eu sou nuvem que passa pra chover
Eu sou fogo para lhe derreter
Quer provar? Dê um pulo em minha frente
Você é o Golias do repente
Mas eu sou um Davi pra lhe vencer
Minha carga de rima é tão pesada
Seja ouro no claro ou lá nas trevas
O poeta peleja, mas não leva
Que é preciso passar nesta lombada
Meu repente vale uma tonelada
E quando eu parto cantando, é pra valer
Faço até repentista esmorecer
Se queixar de cansado ou de doente
Você é um Golias do repente
Mas eu sou um Davi pra lhe vencer
(…)
Para mim você é só um garrote
Pra você eu já sou mais do que touro
És um louco tombando em bebedouro
Eu sou gênio mostrando os meus dotes
Tenho pernas pra dar o meu pinote
Em você faltam pernar pra corre
O meu rio agora vai encher
Você vai se afogar na minha enchente
Você é um Golias no repente
Mas eu sou um Davi pra lhe vencer
São, de resto, estrofes de dez versos decassílabos, forjados ao modo do Martelo Agalopado, e, portanto, com versos acentuados na terceira, na sexta e na décima sílabas, dentro da conhecida estrutura de rima ABBAACCDDC.
In: Florilégio de estrofes da poesia sertaneja (João pessoa: Edições Buscas, 2009)

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