Raul Seixas, o meio e uma juventude, por Vinícius Oliveira

Documentário dirigido por Walter Carvalho, com duas horas de duração, sobre um grande artista nacional seria facilmente repudiado por uma juventude viciada no padrão de cinema hollywoodiano, se não fosse uma questão fundamental, o filme é sobre o artista enigmático chamado Raul Seixas.

Como o próprio filme retrata, Raul é nordestino, nascido na Bahia de todos os santos, que ao conhecer Élvis Presley, através do cinema, descobre o rock e um modo de contestação dos valores impostos. Mas Raul, não é daqueles que apenas absorve a cultura estrangeira, diga-se de passagem que tinha uma qualidade absurda, sem nenhuma espécie de barreirismo nacionalista, chegando à misturar Luis Gonzaga e o seu baião, a contestação da pobreza material e cultural de um país ( que ignora a riqueza cultura do seu povo) para o potencial de um novo mundo que o rock queria construir.

“Eu sou a mosca que pousou na sua sopa”

Mas o momento econômico-político-cultural era duro. Para ser músico era necessário obedecer as lógicas das gravadoras, que na totalidade formavam um grande cartel sonoro, onde uma das empresas chega a reduzir o talento do artista para produtor. Mas com a “malandragem” brasileira, no momento certo Raul que teve que relançar o mesmo Raul Seixas de volta à cena musical. Observem o que mudou isso nos termos da grande indústria da música internacional e nacional? Obvio que temos a utilização de alguns espaços importantes pra socialização da música, mas somos ou não sufocados, negligenciados artisticamente, estuprados culturalmente pela ditadura musical da Sony,Philips,Poligram,Globo etc? Somos ou não a mosca que pousa na sopa das grandes gravadoras? Algumas raras são ouvidas, outras são esmagadas antes mesmo de nascerem.

“É que lá vou eu de novo, Brasileiro nato, Se eu não morro eu mato, Essa desnutrição”

A época era ditadura militar, a repressão era visível. Reunião de jovens era algo subversivo, mas mesmo assim, a juventude ousava se ver, se olhar, se vestir, se escutar, se amar, resistir. Viva a sociedade alternativa! Mas quem é a sociedade alternativa? Abre-te sésamo! A abertura chega, a ditadura oficialmente termina, com muita mobilização e diretas, mas controlada pelos mesmos 40 ladrões que mataram, sangraram, reprimir e censuraram um povo. Agora eles vestiam o povo, eles viam a juventude, eles falavam por ela, eles amavam por ela, eles despiam uma democracia nela, os ditadores alimentavam-nos? “É que lá vou eu de novo, Brasileiro nato, Se eu não morro eu mato, essa desnutrição.” Eu também vou reclamar!

“A verdade do universo é a prestação que vai vencer”

Chegamos ao ostracismo. Raul é esquecido, os lutadores são esquecidos, Glauber Rocha é esquecido. Os sonhos envelhecem. Agora a verdade do universo é a prestação que vai vencer. Todos tem que estar contentes com a aposentadoria na assistência social. Sorrindo com o carro nacional, onde as peças são estrangeiras e eles apenas é montado no Brasil. Policial, médicos, dentista, bombeiro, atores, apresentadoras, jornalistas e diretores de filmes acreditam com seu trabalho estarem contribuindo no quadro social da tentativa de país, chamado Brasil. O ouro de tolo venceu!E esmagou quase que totalmente a sociedade alternativa.

“Eu sou o inicio, o fim e o meio”

Raul é o retrato do rebelde, de um contestador, de um reclamador. A música não precisava ser de protesto, porque viver, ser a mosca, entender do que é feito e quem faz a sopa nesse mundo, e cantar ao mundo era o inicio de um protesto vivo. Raul vivia o que sonhava. Não bastava a vida média, o sonho médio, a exploração média, a opressão média. Raul queria ser o inicio de uma contestação de valores! Individualismo, insensibilidade, propriedade são valores de um sistema, que sempre foi e sempre será desumano. Raul queria ser a luz do luar, a vela que ascende, a beira do abismo, o fim de uma geração que foi derrotada. Mas acima de tudo, Raul queria ser o meio.
O meio através do qual as novas gerações, a juventude soubesse que o embrião da sociedade alternativa está dentro de nós, e não pode coexistir com esse sistema injusto, é preciso que a juventude volte os festivais, as praças, as ruas. Viva a Raul! Viva a todos que lutaram, sonharam, cantaram pra que todas as juventude soubesse que sonhos não envelhecem.

O autor é estudante de comunicação social na UFS.

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