O cadáver que ninguém quer enterrar

'Querido, olhe! Ele já está reforçando suas ideologias!' (Mark Anderson, andertoons.com)
‘Querido, olhe! Ele já está reforçando suas ideologias!’ (Mark Anderson, andertoons.com)

Atualmente, há tantas informações disponíveis que nada mais parece estar disponível. O fato de um panda rolando na grama chamar centenas de vezes mais atenção que o assassinato de centenas pessoas em alguma cidade na Ásia ou na África mostra a falência do modelo de informação contemporâneo.

Um conservador como Philippe Breton tinha alguma razão, afinal, quando dizia que a TV aberta tinha, pelo menos, o mérito de forçar a reflexão sobre o que ‘todos’ deveriam ver – antes de ser completamente abandonada aos tubarões na maioria dos países.

A acomodação é completa quando as redes sociais que mais estimulam o esquecimento são as mais valorizadas como principal instrumento de “transformação social”, enquanto o mundo real desaba em mais de 15 conflitos inimaginavelmente sangrentos. Muitos em países que quase ninguém ouviu falar, como Eritreia ou Sudão do Sul; outros a alguns bairros dali.

Entre as falácias que se desconstroem pouco a pouco desde os anos 1990 está a de que o modelo da TV (de poucos para muitos) seria ‘revolucionado’ pelo modelo da Internet (muitos para muitos), com suas poderosas redes interativas. As mudanças, se existiram, privilegiaram a individualização cada vez maior de seus usuários, agora presos em seus guetos comunitários e bolhas digitais, superconfortáveis com as opiniões de pares ideológicos.

O péssimo jornalismo que se faz nos sites não profissionais de jornalismo – alguns lembrando o igualmente terrível e tradicional jornalismo dos grandes meios – demonstra que os sindicalistas estavam, em parte, certos nos anos 1990 e 2000: destruir institucionalmente a profissão de comunicador em prol dos novos modelos não alinhados não foi uma ideia exatamente brilhante.

Passados pouco mais de 15 anos após as primeiras experiências no Brasil, por exemplo, contam-se nos dedos os sobreviventes. O mesmo se repete pelo mundo, com as gloriosas exceções que confirmam a regra (o jornalismo, afinal, sempre teve bravos nanicos).

A crise na mídia de grande circulação não produziu novos atores – pelo contrário, continua o segmento de mídia superconcentrado em todo o mundo, enquanto os levianos adeptos da ‘ciberdemocracia’ continuam fingindo que está tudo bem. Até porque pega mal dizer que eles estavam grosseiramente equivocados.

O velho está cada vez mais exposto, o que não deu qualquer vantagem para o novo. Se é que há algo de novo.

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