Fiação subterrânea, poder público e cidadania

celpeMais um ano se vai. De triste lembrança para os pernambucanos, marcados pelos pesadelos causados pela Companhia Energética de Pernambuco (Celpe). Um alento à população foi o Projeto de Lei nº 99/2013, aprovado pela Câmara de Vereadores em 11/12/2013, dispondo sobre a substituição e instalação subterrânea de toda fiação aérea na cidade do Recife. Hoje, quem provoca o caos da fiação aérea, vista por toda cidade do Recife e em outras metrópoles, são os fios e cabos que distribuem a energia, as linhas telefônicas, os canais de televisão a cabo, a internet e o que mais houver.
A iniciativa é uma medida de interesse público almejada por toda sociedade. Do ponto de vista da segurança, sem dúvida a fiação elétrica embutida contribuirá drasticamente na redução, ou mesmo na supressão, de tragédias fatais. Segundo a Agencia de Regulação de Pernambuco (Arpe), dez (10) pessoas perderam a vida por choque elétrico causados pela rede de fiação até setembro de 2013 e outras 31 (trinta e uma) em 2012.
O emaranhado de fios nos postes é de responsabilidade de quem é proprietária e aluga o espaço: a Celpe. A companhia alega que 95% do dinheiro arrecadado no aluguel serve para reduzir a tarifa dos clientes/usuários (?) e os restantes 5% seriam usados na manutenção e serviços da empresa. Pura falácia: as tarifas são exorbitantes e a manutenção é péssima, vistas as constantes interrupções, justificadas sempre pela Celpe como decorrentes de “galhos de arvores que rompem a fiação”. Como se vivêssemos em plena floresta amazônica…
O real problema que dificulta a decisão de embutir toda a fiação é que, após o a sanção da lei pelo Chefe do Executivo Municipal, o que implicará vetos a algumas disposições ali mal elaboradas, deverá ainda ser regulamentada. Sem esta, a lei será letra morta. Mais uma que não vai “pegar”. E ai, se o Poder Público não agir, os interesses econômicos falarão mais alto que a vida e o bem-estar das pessoas. Pois a companhia postula que quem pague a conta de enterrar toda (sua) fiação seja o consumidor/usuário. Direta ou indiretamente, através de recursos que o Poder Público arrecada de todos nós via impostos e tarifas.
Cálculo realizado em algumas cidades brasileiras estima que o quilômetro da fiação subterrânea chega a ser até quatro vezes mais caro do que a aérea (de 3 a 5 milhões/km). Mas isso depende de cada caso, que tem que ser estudado. O óbvio é que este custo deve ser dividido entre as concessionárias de energia, telefonia, internet e outros que a gente nem sabe. E, porque não, a maior parte da contribuição ser da Celpe, que ganha rios de dinheiro conforme demonstram seus balanços contábeis, cobrando as tarifas mais caras do planeta Terra.
Bem, a questão fundamental está ai. A Celpe deseja que os custos de instalação (enterramento de fios) de equipamentos que pertencerão à própria companhia sejam bancados/repassados aos consumidores, o que poderá representar no quádruplo do valor da tarifa que se paga hoje. Aqui em Pernambuco, sabemos muito bem o quanto o poder publico contemporiza com as infrações constantes da Celpe, violando até mesmo o contrato de concessão. Portanto, será ingenuidade esperar que os gestores estadual e municipal se confrontem com a companhia, que, diga-se de passagem, esta no topo de arrecadação do ICMS. Ou seja, é a empresa que mais recolhe imposto. E, por outro lado, oferece um serviço cada vez pior aos seus clientes (nós).
Portanto, sabemos que não podemos contar com o Poder Publico, que empurra com a barriga esse problema. Na verdade, ilude a população com a criação de comissões que não chegam a nada, com a aplicação de multas que quase nunca são pagas, etc. Mas na realidade “enrola” o cidadão e posterga medidas mitigadoras e urgentes a serem tomadas.
O PLO nº 99/2013 votado e aprovado pela Câmara de Vereadores do Recife está longe de virar realidade. Daí que não há solução que dispense a mobilização da sociedade, a pressão popular.
Unamo-nos, então. Em 2014, vem pra rua você também, e assim teremos a chance de um dia ver efetivado o enterramento dos fios e o fim das mortes anunciadas de tantos recifenses/pernambucanos por descarga elétrica causadas por fiações impróprias. Para o bem estar do cidadão.
O autor é professor da Universidade Federal de Pernambuco

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