RJ: Funk não é mais caso de polícia, mas de cultura

Cerca de 600 pessoas lotaram nesta terça-feira (25) o plenário da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) para a realização da audiência pública sobre o funk. A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e da Cidadania convidou autoridades públicas, acadêmicos, parlamentares, funkeiros e a sociedade civil.

O debate resultou na consolidação de um novo consenso em torno do funk. Este passa a ser reconhecido como algo mais do que um gênero musical, como a manifestação cultural mais importante do Rio de Janeiro na atualidade.

“Essa audiência foi muito importante porque reflete um novo patamar no debate público em torno do funk. O funk hoje, aqui, deixa de ser um caso de polícia. Essa é uma página virada. O funk passa a ser tema de políticas públicas nas áreas da Cultura e da Educação”, afirmou o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos, ao lembrar que na semana passada intermediou reunião dos funkeiros, organizados na Associação dos Profissionais e Amigos do Funk (APAFunk), com o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Mário Sérgio, que resultou na promessa de uma nova conduta policial em relação ao funk.

Marcelo leu, durante a audiência, ofício do presidente da Alerj, Jorge Picciani, anunciando a votação de dois projetos de lei propostos pelo mandato. Um prevê a revogação de lei de autoria do deputado cassado Álvaro Lins, em vigor, que tem sido usada pela polícia para reprimir o funk. Outro projeto prevê o reconhecimento do funk como manifestação cultural. A votação vai ocorrer em sessão extraordinária, às 18h30 do próximo dia 1º/9.

Em nome do governo estadual, as secretárias de Cultura, Adriana Rattes, e de Educação, Tereza Porto, assumiram o compromisso público não só de reconhecer o valor do funk para a sociedade como também a viabilização dos meios para garantir a sua livre expressão cultural no Rio de Janeiro.

“Gosto muito de baile funk”, disse Adriana Rattes. “O reconhecimento do funk como manifestação cultural é um grande avanço institucional. O que se promove hoje é um novo marco legal das políticas públicas em relação ao funk, que envolve o reconhecimento também do seu valor transformador. O funk tem a potência de transformar a sociedade. Isso não é parceria nem intenção, é compromisso”, afirmou secretária estadual de Cultura.

“Reconhecer o funk como manifestação popular, como linguagem, como cultura, é coisa óbvia”, disse Tereza Porto. “É claro que vai ser revogada essa lei (que concede à PM o poder de censurar o funk)”, concluiu a secretária de Educação.

Metade da vida dedicada ao funk, o presidente da APAFunk, MC Leonardo, afirmou: “A polícia não é o caminho. A gente não precisa procurar o comandante de um batalhão pra dizer que é um trabalhador. Ninguém aqui quer o funk sob a tutela da polícia. O funk é democrático e pagamos um preço alto por isso. A nossa luta é pela unificação dos funkeiros, para que esqueçam um pouco as suas carreiras, as suas empresas e se unam para lutar pelo direito à cultura do Rio de Janeiro”, disse MC Leonardo, depois de lembrar da época em que, sem espaço para trabalhar como funkeiro, teve que mudar de profissão e dirigir táxi.

Para a artista Fernanda Abreu, o momento é favorável para uma mudança de perspectiva do poder público em relação ao funk: “Hoje, as autoridades estão reconhecendo o funk como algo que é importantíssimo e estratégico para o país”. O antropólogo Hermano Vianna, um dos primeiros a desenvolver estudos sobre o funk, revelou que o gênero movimenta R$ 10 milhões por mês no Brasil, embora em um contexto adverso e de bastante informalidade. “Não conheço ação tão repressiva contra qualquer outra manifestação cultural como ocorre com o funk. Hoje, essa audiência, é sinal de que isso pode mudar”, disse o antropólogo Hermano Vianna.

A antropóloga Adriana Facina lembrou que a perseguição ao funk ocorre hoje tal como já se deu com o samba, numa época em que era tratado na mídia como algo “pernóstico, negróide, ridículo” ou de “pretalhada”, expressões usadas em artigos de jornais quando Pixinguinha e seus músicos viajaram para apresentações na Europa no início do século passado. “Proibir os bailes funks faz parte de um processo de criminalização de jovens pobres, favelados, a maioria negra. É necessário garantir aos pobres o direito de se expressar, jovens que a sociedade vê como lixo, como se fosse melhor se não existissem. O funk tem que ser assunto de cultura e não de polícia. Essa é uma luta pela liberdade de expressão e pela diversidade cultural”, defendeu Adriana Facina.

O Legislativo e o Executivo federais também foram representados na audiência. O deputado federal Chico Alencar (PSOL) comparou a situação do funk na sociedade com a das milícias, para mostrar que é possível, por meio da luta, promover uma mudança de paradigmas na sociedade: “Está acontecendo com o funk o que aconteceu com a negação das milícias”. O ministro da Cultura, Juca de Oliveira, enviou a sua mensagem por carta: “Impedir que funkeiros se reúnam em torno de sua música, de sua dança, de suas festas é um remédio inadequado contra a criminalidade. (…) Não podemos reprimir o funk, nem discriminá-lo com preconceitos, tampouco proibir de qualquer modo a sua existência e as particularidades de sua formação cultural”.

Também participaram da audiência os parlamentares Alessandro Molon, Paulo Melo e Luiz Paulo Corrêa da Rocha.

E, como não poderia deixar de ser, o funk entremeou os discursos ao longo de toda a audiência. Os raps do Silva, da Liberdade e Tá tudo errado, entre outros, tornaram-se trilha sonora da discussão em torno da necessidade de estabelecer políticas públicas que garantam a livre expressão do funk no estado. “É som de preto, de favelado, mas quanto toca, ninguém fica parado, tá ligado”, lembrou Marcelo Freixo, em citação dos versos de Som de preto, da dupla Amilckar e Chocolate.

3 comentários sobre “RJ: Funk não é mais caso de polícia, mas de cultura”

  1. Isso é uma vergonha, é um lixo!
    Funk uma verdadeira apologia ao crime e a prostituição, e esses políticos querem tirar proveito da ignorância e do desânimo de um povo completamente manipulado.

  2. Isso é uma vergonha… Mulheres defendendo o estilo de musica que faz delas um objeto de consumo. Adriana Rattes, tu deveria perder o emprego por isso. =/

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